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01/06/2014

ME LEVA, MEU BEM

Totonha do Prudêncio era o cão em forma de gente. Implicava com todo mundo na rua e ai de quem caía em desgraça com ela. A língua da mulher era afiada por demais. Foi por isso e muitos outros issos que Totonha não era benquista no seu meio.
Totonha tinha o amor do Prudêncio e isto lhe bastava. Mas não é que num certo dia o Prudêncio resolveu que era hora de ir embora? Bateu as botas e foi levado pelos amigos para o cemitério. Totonha entrou em desespero e gritava, descabelando-se, acompanhando o caixão:
- Me leva, Prudêncio! Me leva cocê! Ai, meu Deus, que mundo triste o meu!...
Os gritos eram tão fortes que passaram a incomodar até ao Padre Anacleto que ia puxando o terço enquanto ajudava a levar o amigo pra última morada.
Chegando ao cemitério, tava todo mundo pedavida com a gritaria de Totonha.
- Me leva, Prudencinho, eu quero í tamém... Me leva, meu bem! Buáááá....
Os amigos não sabiam se choravam a morte do Prudêncio ou se passavam uma espinafrada na Totonha. Alguns chegando a pensar que aquele exagero era forçado e que não havia muito sofrimento ali não.
Foi aí que ela se descuidou, olhando pro Prudêncio dentro do caixão, no fundo da cova - o que veio a trazer gostinho de vingança pros amigos. Escorregou e bateu deitada em cima do caixão do marido, bem cara a cara com ele. E Totonha, que tanto queria ir com o Prudêncio, olhos arregalados de pavor, deu revertério no desejo e, aos gritos, suplicava:
- Me tira daqui, meu povo! Me larga Prudêncio!... Socoooorrrro!!! Pelamor de Deus, me tira daqui, gente!!!!
(Causo contado pelo amigo Divino Martins, de Itapuranga-GO)
©By Eurico de Andrade, in Tabuí e seus Causos  https://www.facebook.com/causos e http://tabui.blogspot.com.br/

21/03/2013

VELÓRIO COM BÊBADOS




     O Tião Catarrinho, junto com mais uns doze ou quinze, formavam a turma do copo de Tabuí. Quase todas as noites tavam eles, em cantos diferentes da cidade, entornando pinga na goela. E só altas horas da noite procuravam o caminho de casa, que às vezes encontravam. Numa noite dessas o Tião, na insistência de descobrir o caminho de casa, acha uma casa com grande movimento e resolve entrar. É velório. Ele entra mesmo sem convite, esperando encontrar café, broas, bolos e biscoitos. Acha é nada. Senta numa cadeira à cabeceira do defunto e fica assuntando, esperando engano pro estômago vazio.
     Poucos minutos de sossego, chegou uma velha chorando, que passou a mão na cabeça do falecido e disse:
     - Coitado, morreu feito um passarinho...
     O Tião respondeu:
     - Hã- Hãn!...
     A mocinha bonita que veio a seguir passou a mãozinha maciinha no rosto do falecido e falou baixinho, coisa que só o Catarrinho conseguiu escutar:
     - Tadinho, morreu como um passarinho...
     - Pois num é?... – respondeu, com uma piscada d’olhos, o Catarrinho.
     O mesmo aconteceu com um rapaz fortão que deu um coque no coco do defunto:
     - Coitado docê, morreu quinem um passarinho...
     Tião não respondeu nada, com medo de levar coque também. Depois de passarem umas trinta e tantas visitas, todas dizendo a mesma coisa, o Tião não responde mais nada e já tinha firmado juízo sobre a morte do defunto. Foi aí, bem pra lá da meia noite, sem o café, os bolos, as broas e os biscoitos, que chegou outro mais bêbado que o Tião Catarrinho, procurando a mesma coisa, naquele movimento inesperado. Ao ver o colega, marca o rumo e chega lá, tropeçando nos próprios pés.
     - Ô Tião!... Hic!... Esse daí morreu do quê?
     - Ah, Kussen Pestana, eu num tenho certeza não, sô...Hic!... Mas tô achano que foi duma estilingada!.... 

(Reescrito, com base em causo enviado por MTFreitas, de Caxambu-MG)

16/03/2013

MOVIMENTO DE MADRUGADA




Altas horas da madrugada, cambaleando rua a fora, vai o Cirino. Bêbado, mas lúcido. A grana andava tão curta que nem jeito de ficar bêbado completo ele tinha.  Assim que passa pela esquina da Rua do Assobio com o arremedo de praça que Tabuí tem, Cirino vê movimento estranho e resolve espiar o que acontecia. Casa cheia de gente. Cirino logo pensa em pinga grátis. Era velório.

Entra e fica num cantinho, ressabiado, assuntando, apreciando o movimento. Foi quando ouve um comentário:

- Gente, vamo fazê uma vaquinha pra gente comprá uns trem pra cumê e bebê?

- É memo, sô! Vamo fazê causdiquê da casa num vai saí nada não. A situação tá braba.

E começa alguém a passar um chapéu, aonde os visitantes iam colocando os trocados. Cirino já alegrinho, pensando na pinga que iria chegar. Quando o chapéu passa perto da viúva, ela ia colocar duas notas de dois reais. O moço do chapéu não aceitou de jeito nenhum:

- Não, dona viúva! A senhora num picisa... Já entrô cu difunto!...

A viúva, emocionada com o gesto dos amigos do falecido, põe-se a reclamar da vida:

- Tadim do Gripino, gente! Vaimbora pra sempre... Prum lugá fechado... Moiado... Iscuro... Ondé qui nem tem o de cumê!...

Cirino ficou tão incomodado com aquilo que nem quis mais esperar a pinga e os comes.

- Ê-Ê!... Tá pareceno quiela tá quereno levá o falicido lá pra casa, uai!... Eu, heim!...

20/02/2013

DEFUNTO FALSIFICADO




A igreja tava um frejo quissó... Povim reunido. Comemorando? Não. Velório, o do Alceu. Morreu o homem, que um dia fora vereador, muito conhecido em Tabuí e redondezas. Padre Anacleto, querendo descansar um pouquinho, passa a palavra pro prefeito. E este não perdoou, gavando o falecido e tentando garantir uns votinhos pra próxima eleição, já que iria candidatar-se de novo, pois que, na política, ninguém é doido de largar o osso facilmente.
- Nunca vi homi mais cristão do quiesse daí, minha gente! Fervoroso demais da conta, na igreja todo domingo e às veis na segunda e na quarta!... – Foi assim que começou o prefeito.
- E tem mais, meu povo!... Esse homi sempre foi pai bão, inzenplar... Óia os fio dele, tudo gordim, barrigudim e na iscola!... – Assim continuava o prefeito enquanto os dois mais velhos, dos oito filhos, do defunto, se cutucavam e riam amarelo ante a aproximação da fama.
- E óia inleitores!... Era marido dos bão tamém, de primera!... Co’a muié tava sempre cumprino a obrigação, prontim sempre que egigido... Era home fiel, chegava in casa na hora certa... Num tinha nada de bebê e ficá nas farra até o sol aparecê!... – Foi assim que terminou o prefeito porque a Deusdalina, a viúva, não aguentou mais ficar calada.
- Padre Anacleto, péra, péra, péra!... Discurpe atrapaiá, já atrapaiano!... Quero abri o caxão. Num pode sê. Esse daí que o prefeito tá falano num pode sê meu marido Arceu... Nunquinha, sô!