Totonho da Marianica mora na zona rural de Tabui, umas duas léguas do
centro urbano, num sitiozinho bem ajambrado, lá onde o Sorongo faz uma curva,
no sopé da serra do Urubu. Leva uma vida tranquila, sobrevivendo do que lhe dá
a terra: arroz, feijão, milho, batata, abóbora, mandioca. Tudo plantado, e
colhido na época certa. Um pomar com abundância de frutas. Ainda por cima, uns
porquinhos de engorda, e as galinhas que produzem ovos e frango caipira à
vontade. Afim de arrumar uns trocados para pagar suas contas, e abastecer o
sitio de suas necessidades, todo domingo, lá vai o Totonho participar da feira
na cidade. Quando tem muita coisa para levar, enche a carroça, atrelada ao
burrico, seu velho companheiro de muitas lidas. Quando a produção é escassa, os
frangos, piados, vão dependurados na cabeça do arreio, e os outros produtos
enchem dois jacás de cada lado da montaria. E lá se vai o Totonho no lombo do Jurumela,
o seu burrico.
Naquele domingo aconteceu o inesperado. Chegando na entrada da cidade, o
Jurumela empacou e não teve como arredar
o bicho do lugar. Nem com carinho, nem com violência. Meio desesperado, Totonho
foi pedir ajuda.
- Óia, Totonho, cê tá cum sorte. Tá veno aquela casa cum a
loja ali no começo da rua? É dum dotô veterinário qui chegô aqui fais
poco tempo. Ele intendi de animar, e podi ti ajudá, homi.
- O que o senhor deseja, seu moço? - pergunta o veterinário, ao
abrir a porta de casa.
- Negósiguim, dotô. Tô cum burro impacado ali na entrada da
cidade, e disseru qui o sinhô tem remedim presse inguiço.
- Pra tudo dá-se um jeito, meu senhor. Pra animal empacado, o
remédio é este aqui. Pega estes dois tipos de pimenta. Esta daqui é mais
fraquinha, e esta outra é bem braba. O senhor chega lá, levanta o rabo do
animal, e enfia no fiofó dele esta que é a mais fraca. Deve dar resultado e o
bicho vai desempacar. Se falhar, o senhor entra com a outra. Ai, não tem jeito.
Vai funcionar.Mas toma cuidado porque o bicho pode sair correndo, e vai dar
trabalho para segurar. Muito agradecido, lá se foi o Totonho aplicar o remédio.
Uma semana depois, estava lá o Totonho gerenciando sua banca de feira,
quando foi reconhecido pelo veterinário, carregando uma sacola de frutas e
verduras.
- E aí, moço? Resolveu o problema do burro empacado?
- Resorvê até qui resorvi, mais teve um pobreminha.
- Poisé, eu fiz quinem o sinhô mandô. Peguei a pimenta mais suave e infiei no rabo do burro. O bicho saiu numa correria danada, e se eu num uso a otra pimenta no meu, tava campiano o danado inté hoje.
(Causo "garimpado" em Carmo do Rio Claro-MG pelo pesquisador Joaquim da Silva Junior)
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