O circo chegou de novo em Tabuí. Cirquinho fuleiro, com a
lona rasgada, cobertura remendada, ferragem enferrujada, tábuas rachando, mas
era circo. E o povinho, doido por uma diversão. Como todo circo, diziam que
tinha uns palhaços, o mágico, a menina
da bicicleta, o homem das facas e outras coisitas mais. Mas o que o povo queria
mesmo eram os bichos anunciados: o tigre e o leão. Ah, Tabuí já tava ficando
cidade grande, recebendo bichos estrangeiros que, decerto, nem entendiam a
língua brasileira. Na noite que antecedeu o primeiro espetáculo, houve quem nem
dormisse, de tanto alvoroçamento.
Mas, como
sempre tem uma coisa para atrapalhar a vida do pobre que se satisfaz com pouco,
no dia do espetáculo, morre o leão. Um bafafá dentro do circo. Sem o leão a plateia
seria menor, menos dindim entrando, um fiasco... O Palhaço Rachid, o mais ajuizado
da empresa, deu a ideia:
- Gente, vamo
arrumá arguém pra se visti de leão... É a solução!...
Assim, bem
dentro do confabulamento, descobriram lá no canto da Rua do Assobio, o
Godofredo que tava em época de safra de pinga, tomando todas, mesmo com o dinheiro
ralinho. No começo, o Godô deu pra trás.
- Eu, heim!?...
Visti de leão? Nenunca vi isso... E cum tigre dentro da jaula? Tá brincano,
sô!...
Mas não
precisaram insistir muito. Nada que uns trocados não pudessem resolver.
- É... Tá
certo. Tomo umas pinga e vô... E seja o que Deus quisé!...
Duas horas
antes da estreia, tá lá o Godofredo chapado, vestindo a pele do leão que fora
tirada do bicho morto e já apresentava sinal de cheiro esquisito. O locutor, no
maior suspense, anuncia para a cidade toda ouvir:
- Agora com
vocês, vindos direto da África, o leão e o tigre! Uma salva de palmas pros dois!...
Povim não
economizou nos aplausos. Barulho quisó. Godofredo, dentro da pele do leão e com
muito enchimento em volta do corpo, entrou correndo na frente e com o desconfiômetro
ligado. Morrendo de medo do tigre. Por isso, não perdia aquele bicho esquisito de
vista. O domador dos bichos de vez em quando estalava um chicote que fazia o
Godô se encolher todo. E quando o tigre foi chegando mais perto, Godô sentiu
ânsia de gritar “ai Jesus!”, mas se segurou. Deixou ficar do jeito que tava pra
ver como é que ficava. Na hora em que o tigre soltou um gritinho muito do
senvergonha, quando o chicote estalou no seu ouvido, Godofredo sentiu que ia
desmaiar. Mas foi bem por causa do gritinho do tigre que a plateia se levantou
de tanta emoção e fez o maior barulho já que nunca tinha ouvido voz de tigre. Foi
nesse momento de barulheira que Godofredo foi surpreendido com uma vozinha
vinda do colega tigre:
- Ô sô!...
Quanto é quiocê tá ganhano?
3 comentários:
Palmas para este.
Parabéns Eurico.Senti muita peninha do Godofredo...Dei muitas gargalhadas,obrigada.Um abraço.Eunice
Mas esses dois... coitados!
Muito bom esse!
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