01/11/2008

Palavra de Bêbado Vale?

Dois negociantes da cidade grande resolvem sair pelo interior a fora a fim de passar a perna na capiauzada.
Foi aí que chegaram a Tabuí, cidadezinha alterosa. Num boteco de um cantinho da cidade, caladinho, sentado num tamborete, estava o velho Vito. Cavalinho piquira lá fora, esperando o dono tomar umas e outras para depois carregá-lo com toda paciência para casa.
Só que o velho Vito, capiau desconfiado e esperto, sem nem um tostão no bolso, estava esperando alguém para também dar um golpe.
Quando os dois bacanas entram no boteco, tendo visto o cavalinho lá fora, olham gulosos para o velho. E este, vendo os dois, mira sedento nos olhos de cada um e faz aquele ar tristonho de capiau sofredor e ignorante. E o Vito, mesmo olhando a importância dos dois, pensa com os seus poucos botões: "pra quem tá com fome e com sede duma branquinha, formiga é pimenta do reino. Vô enguli essas duas formigonas engravatadas..."
- Não quer vender o cavalo, meu amigo?
- Vendo uai! Vinte mil mango é o preço dele. Quem pagá leva!
Os negociantes se entreolham e resolvem executar um plano que já tinha dado certo diversas vezes. Encher de cachaça o vendedor para levar o animal praticamente de graça.
- Não quer acompanhar a gente num traguinho, meu amigo?
- Carece não, moço! vô injeitá! Responde o velho Vito já arrependido da resposta. Boca seca. Sede danada duma branquinha queimadeira.
- Eu insisto, meu amigo! Venha pra junto de nós!
O velhinho sai, morrendo de humildade, do seu cantinho, e de uma golada só entorna no bucho meio copo de cachaça e ainda lambe os beiços.
Os negociantes gostam da reação do velho e pensam: "já está no papo". Mandam encher outro copo que o velho Vito entorna novamente de uma golada só.
- Quanto é mesmo o cavalinho, meu amigo?
- É trinta. Trinta mil mango é o preço dele. Quem pagá leva.
Os dois da cidade grande se olham meio assustados; Pedem mais uma talagada para tirar a dúvida, e o velhinho emborca tudo de uma só virada.
- O cavalinho é quanto mesmo, meu amigo?
- É corenta. Corenta mil mango. Quem pagá leva.
Depois de mais uns três copos da branquinha, com o velho Vito já bêbado, de quatro e trocando as palavras, o cavalinho já estava custando setenta mil paus. Os dois negociantes cada vez mais assustados e ficando sem graça com a história. Entornam mais bebida no velho.
- E o cavalinho, velho, diga quanto você quer por ele?
- Ieu? Hic... Quero nada não, moço! Hic... Num é pra vendê mais não! Hic... Ia vendê ele pra tomá uns golo. Já tomei dimais da conta, agora vendo mais meu amiguinho não, uai! Hic!..

4 comentários:

Dalinha Catunda disse...

Oi Eurico

Bêbado quando dá pra ser teimoso,
Não é brincadeira não.
Bebe uma, duas e três,
Chega até a cair no chão.
mas não quebra a palavra
fica cheio da "marvada"
Mas não muda a opinião.

Dalinha Catunda

Unknown disse...

Bravo, Dalinha! Mais uns versos de uma artista do sertão para o meu Tabuí. Obrigado.

Jalul disse...

Dalinha tá danada de gosto pelas rimações. Isso é bom!
Conhecia esse causo através do Coronel Ludugero. O causo é bom e não perdeu nadica de nada agora, quando escrito por Nhô Eurico.
Valeu, blogueiro!
Grande abraço.

Unknown disse...

Ah velhinho esperto! Também não dá certo um mineiro passar a perna no outro, não é assim, Eurico? Pelo menos em relação à grana. Bem feito para quem queria enganar o pobrezinho!
Eu como sempre entro no texto e me personalizo de alguma forma.
Muito bom, Eurico!
Parabéns, e não deixe de me avisar, quando tiver causos de Tabuí.

Abraços

Mirze