03/06/2014

CONVITE INESPERADO

     O Amâncio, cansado da vida na cidade grande, resolveu que era hora de aposentamento. E sabem ondé que ele foi parar? Em Tabuí, claro. Bem pros lados do Sapé comprou uma fazendinha, a Flor do Vale, longe de tudo e de todos. O homem queria ficar sozinho. Quanto mais longe da vizinhança, melhor. Só buscaria a famiage se conseguisse adaptar-se à vida solitária de homem da roça.
   Começou com umas vaquinhas leiteiras. Sem pasto pronto, foi arranjar a pastagem roçando a capueraba, primeiro em volta da casa e depois, distanciando-se aos poucos, jogando semente de capim meloso, que dá um leite mais gordo, bom pra queijo. Aí passou a fazer as cercas, sozinho mesmo, formando os piquetes.
     Vez ou outra a solidão tomava conta do coração do Amâncio. Sentia saudades da família lá em Beozonte, vontade de contar umas piadas, beber uma cervejinha, bater uns papos fiados com qualquer um...
     E não é que Deus condoeu-se da solidão de Amâncio? Mandou-lhe um visitante, o Pedrão. Caipira, homem rústico, barbinha rala, bigode comprido, botas de cano longo, chapéu de palha furado na aba. Revólver e peixeira na cintura pra fazer o tipo machão. Chegou num cavalinho piquira, fraquinho de fazer dó. E o papo rolou. Amâncio juntou a fome com a vontade de comer. Abriu o coração pro Pedrão e contou da sua vida. E Pedrão retribuiu.
     - Daqui lá em casa tem umas três légua, sô. A minha fazenda faz divisa ca sua, daquela mata indiante. Me contaro quiocê mora aqui sozinho e vim mode confiri e convidá o vizinho pro meu niversário, no sábado. A gente vamo passar a noite bebendo e comendo pra mode comemorá. E vai tê cachaça, causdiquê sem cachaça num tem festa, num é mezz?
     - Mas eu não tomo cachaça, senhor Pedrão. É claro que não tenho nada contra os que tomam...
     - Mas, óia, sô... Tem mais. Pode sê de acontecê arguma briga, viu Amanço?...
     - Problema não, Pedrão. Não entro em briga de ninguém. Meu negócio é paz...
Foi nessa hora que o Pedrão montou no seu cavalo, pronto para ir embora e resolveu dar mais um aviso:
     - Ó, sô... Vai podecê que role por lá um séquiço servage tamém...
     Nessa hora o Amâncio engoliu a fala e ficou pensativo... “O que será que esse caipira entende por sexo selvagem?... Que trem mais esquisito esse, uai!”.
Curioso com o assunto, antes que o visitante saísse no piquira em desabalado galope, arriscou uma última pergunta:
     - Que roupa devo vestir para a festa, Pedrão?
     - Se prucupe não, Amanço. Pode ir de quarqué jeito. A festa é só pra nóis dois memo, uai!...
(Causo contado pelo amigo Divino Martins, de Itapuranga-GO)
©By Eurico de Andrade, in Tabuí e seus Causos  https://www.facebook.com/causos e http://tabui.blogspot.com.br/

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