Bastiana saiu de Tabuí muito cedo. Buscar
mundo, ganhar uns trocados e caçar jeito de ser feliz.
- Aqui num tem bera pa pobre não, mãe!... Vô
simbora!
E foi. Empreguinho aqui, empreguinho ali,
Bastiana correu seu mundo e comeu do pão que o diabo amassou. Mas como a vida é
dura só pra quem é mole, a moça arranjou profissão que atendia aos seus
predicados, pois não exigia instrução. Lavadeira. Correu boato – que chegou aos
ouvidos de Bastiana - de que lá em Carmo do Rio Claro a profissão tinha futuro.
Cidade muito católica, com muitos padres, religiosos do colégio e do seminário
e dúzias de estudantes. “Homaiada sem muié deve de tê monte de ropa pa lavá”, matutava
a tabuiense.
Ao chegar ao Carmo, depois de uma via-sacra
por várias cidades, Bastiana em pouco tempo arranjou companheiro, mais manso
que carneiro de rifa, que lhe fez duas filhas. Mas como ovos e juras são feitos
para quebrar, ele, por sua vez, também fincou pé no mundo e foi caçar jeito de
ser feliz. Enquanto as filhas cresciam em tamanho, sabedoria e graça, Bastiana,
dia e parte da noite, lavava as roupas do povo do seminário, dos religiosos, de
uma ou outra madame da cidade e da roça e até de uns fazendeiros. Dentre eles,
o sô Gláucio, muito antes de ficar rico fabricando e vendendo sorvetes.
Lavadeira organizada. Aos sábados, entregava
limpinhas e bem passadas as roupas dos seminaristas. Nas segundas, as dos
irmãos do seminário e do Colégio Montfort. Nas terças e quartas, roupas das
madames fulana e sicrana; até que chegava naquelas do fazendeiro Gláucio. Todas
as roupas que passavam pela Bastiana eram levadas ou buscadas em sacos de pano
e cobradas por saco, embora este não entrasse na conta. A lavada e a passada do
dito-cujo eram brindes da lavadeira e das filhas. O sô Gláucio, como gostasse
dos serviços da Bastiana, estabeleceu o costume de toda sexta, quando ia buscar
o seu saco de roupa, deixar como agrado para a lavadeira um pedaço de fumo de
rolo, que ele mesmo fabricava. Durante anos ficou o costume. Uma forma de
agradecimento por um serviço tão bem feito, sabedor que era do gosto da mulher
por um pitinho de palha.
Mas, quando o rico geme é o pobre
quem sente a dor, o agrado teve
um dia que chegou ao fim. O fazendeiro, num dia em que amanheceu comendo fogo e
arrotando brasa, chegou para a Bastiana e começou a se queixar da vida. Tudo
muito difícil, os negócios lencando, a crise era geral.
- De hoje em diante, dona Bastiana, vô tê
que descontá o preço do fumo. Vô abatê na conta da roupa lavada...
Primeira vez na vida que Bastiana ficou
brava com um freguês. Já que em pé de pobre é que o sapato aperta, botou os
cachorros em cima, encarou o fazendeiro e retrucou no ato:
- Ô sô Gláucio! Se o sinhô vai suspendê o
fumo, eu vô tê que levantá a ropa... E óia aqui, ó: vai tê que entrá tudo, o
saco tamém!...
(Este causo me foi contado pelo meu amigo e ex-professor Joaquim da Silva Junior, de Carmo do Rio Claro-MG)
2 comentários:
Excelente, meu amigo Eurico. Beleza de Bastiana, belo causo ... como sempre muito bem contado.
Excelente meu amigo Eurico. Adorei a Bastiana e seu causo, aliás, muito bem contado.
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