12/04/2009

O assassinato da mula

Julgamento. Tá lá o juiz cochilando. Advogado do réu metendo a lenha, pronto a enfiar a mão no bolso de alguém. Platéia espremida feito sardinha. Grande acontecimento em Tabuí. No banco das testemunhas, só, o Tõinzin Carapina, velhinho e franzino, piscando miudinho, recebendo a saraivada verborréica do advogado perfumado que, embora ninguém dali nem notasse, tropeçava nos pronomes e nas concordâncias. Tõinzin doido pra ganhar um troco da outra parte, pra tapar os prejuízos, era inquirido pelo advogado.
- Este homem, senhor juiz, assim que aconteceu o acidente, disse que não tinha nada, não quis ajuda de ninguém e foi embora! - esbravejava o advogado, apontando diretamente pro nariz do Tõizin.
- É não, sô juiz! Ieu...
- Senhor Antônio Carapina! O senhor, ao entrar na sua caminhonete velha, amarrar a porta com uma corda e sumir no mundo, não disse que estava bem e que não precisava de ajuda?
- Ieu?... Quero expricá!... Vô contá do começo, de inhantes do acontecimento!...
Tôinzin era só humildade. Tremia, alvo de tantos olhares e o cheiro do seu suor nervoso viajava pelo salão do júri improvisado
- O senhor não tem que explicar nada! É só me responder: o senhor afirmou ou não que estava bem?
- Ieu?... Sim e não...
Foi aí que o juiz achou que era hora de interceder, tomando interesse pelo assunto.
- Deixe o homem falar, doutor! Para esclarecer a verdade, precisamos ouvir os dois lados.
Tõinzin respirou aliviado.
- Brigadim, dotor juiz! Eu e a minha muié, plena madrugada, acordemo a mulinha, coloquemo ela na caminhonete e eu vinha pela rodovia a fora. Só eu e ela, a mulinha. Ela na carroceria e eu na buléia. Aí veio aquela rural doida, saindo não sei donde do meio do mato e trombou na porta da minha caminhonete. Eu me machuquei muito, pois a porta do outro lado se abriu e eu caí. Caí e saí rolando estrada a fora. Nem conseguia me levantar. Minha mulinha, tadinha, tamém num tava em situação boa não. Zurrava feito besta, caída do outro lado da rodovia. Eu dei conta de levantá a cabeça e vi a bichinha, a uns 15 metros, esperneando e estrebuchando. Aí chegou o home da polícia e, no lugar de vir me olhar primeiro, foi ver a mulinha que dava mais escândalo. Acho que ele avaliou a situação e disse não tem jeito. Pegou o trabuco e deu um tiro bem na testa da bichinha que quetou na paz de Deus Pai. Aí ele veio cambaleando pro meu lado, com o trabuco na mão, ainda soltando fumacinha, e explicou: "Não teve jeito. Tive que matar sua mula que tava muito mal. E o senhor, está bem?". - O que o senhor queria que eu dissesse, sô juiz e sô adevogado?

(Nota: este causo é muito conhecido em Minas Gerais. E muito divulgado. Esta é apenas mais uma das versões que ele recebeu).



7 comentários:

Blog do Beagle disse...

Tudo bem. Eu entendo! Bjkª. Elza

Anônimo disse...

ganhaste uma nova seguidora!

lula eurico disse...

Sempre um bom causo. Parabéns. E o Tóinzim né nada besta, né?

Abraçamigo e fraterno.

Dalinha Catunda disse...

Olá Eurico,
Passei para conferir os novos "causos"
Como sempre super engraçados,
Um abraço,
Dalinha

3ª IP Ouro Preto do Oeste disse...

ola amigo, volto aqui para pedir que altere meu banner e meu endereço, obrigado

Newdelia disse...

Oiêee!
Memorável! Paraabéns!
E o Tóinzim de bobo não tem nada, certo? rsrsrs...
Beijocas

Cilene Cicera Santos disse...

Adorei o estilo do seu blog! se possivel poderia me dar uns toques?