Tabuí tem o Zé Cravinho que não é advogado, mas é como se fosse.
Tretou, relou, tá ele metendo palavras complicadas no meio dos seus
comentários. Palavras tão difíceis que as frases chegam a perder o sentido. E Zé
Cravinho ficou tão famosos com suas prosopopeias e outras figuras de linguagem que
o povinho vinha fazer-lhe consultas, julgando-o, de fato, um advogado. Ainda bem
que, diferentemente da maioria dos advogados, o nosso rábula cobrava barato
pela consulta.
Pois bem. Eis que o Natal ia chegando e o Cravinho, dois ou três dias
antes, resolveu comprar um peru para a festança. Soltou o inocente no quintal
para engordar mais um pouquinho e no dia combinado com a mulher, véspera do Natal,
acorda de madrugada, faca em punho e vai em busca do peru. Depois de procurar
por todos os cantinhos chegou à conclusão de que o dito sumira. Suspeito número
um, o vizinho. Delegacia na hora.
- Senhor delegado, o motivo que me traz aqui é que na noite anterior
ao dia em que vos falo, um desses marginais da lei, que o vulgo chama de
ladrão, penetrou os umbrais do meu acotijado tugúrio e dele surrupiou o meu
ágape dominical que na Escala Zoológica de Renner denomina-se “galinaceos parvos occidentalis”.
O delegado arregalou os olhos, abriu a boca e não sabia o que falar.
Zé Cravinho entendendo aquilo como sinal de admiração, continuou a verborreia:
- Senhor delegado, não é o valor intrínseco do semimovente que me traz
aqui. É que ilibados confrades meus iriam imolá-lo em holocausto ao meu
honomálio...
Foi aí que a autoridade não aguentou mais e resolveu retrucar, com
aquela elegância característica dos delegados às antigas:
- Ou traduz ou tá preso!
O Cravinho ficou tão aborrecido com o revertério da situação que se
assentou na cadeira, arregaçou a manga da camisa, cruzou as pernas e os braços,
olhou pro delegado e sussurrou com tristeza:
- Roubaram o meu peru!...
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