15/09/2009

O Prefeito e a Providência

Prefeito de Tabuí era uma negação. Nenhum progresso trazia pra cidade que parecia caranguejo. Só ia pra trás. Entrava ano, saia ano e Tabuí continuava na mesmice de sempre. Nas redondezas aquela terrinha começou a ser chamada de "já teve". Já teve campo de futebol, já teve rodoviária, já teve escola municipal boa, já teve zona decente...
Um dia prefeito recebe uma reclamação:
- Sô prefeito, o teto do grupo caiu!
- Que grupo, meu fio?
- O grupo, sô prefeito! O grupo escolá! L'adonde a gente aprende a lê!
- Ah, bão! Dexa comigo que vô tomá providência!
Tomava providenciamento nenhum. Esquecia. Ia pra casa, escondia dos problemas e não dava mais o ar da graça.
- Prefeito, a ponte do corgo seco quebrô!
- Quebrô? Pode deixá! Vô tomá providência!
- Prefeito, a gente picisa duma iscola no Pindura Saia! Dá um jeitinho!
- É cumigo memo! Vô tomá providência!
Povo foi ficando chateado. Nervoso. Revoltado até com o descaso do prefeito. O homem não queria nem saber quem lustrou as costas da barata e nem quem botou fogo no inferno. Vivia encafuado dentro de casa. Vez ou outra é que apontava o nariz. Bastava ouvir reclamação sumia de novo. E ainda dizia que ia tomar providência...
O caso ficou mais sério no dia da enchente. Rio Sorongo não deu conta de segurar aquele aguão todo dentro das suas caixas. Entornou água na metade da cidade. De quebra lavou tudo no cemitério. Era defunto boiando, esqueleto escorrendo rua a fora, caveira descendo ladeira abaixo... Tanta mortaria pelas ruas que arrepiava até cachorro vira-lata. O defunto da gorda Dorotéia, enterrado dois dias antes do dilúvio, deu o maior trabalho pra ser encaixado de novo na sua última morada. Continuou teimosa na morte como o foi em vida. E o prefeito dizendo:
- É comigo memo! Deixa que tomo providência!
Povo desorientado resolveu tirar o desgramado do prefeito de dentro do seu esconderijo. Alguns cidadãos mais indignados invadiram a casa da autoridade. Tava lá o homem, num quartinho dos fundos, só de cueca, cercado de garrafas vazias, num porre danado e tomando mais uns goles de Providência, a famosa pinga do vale do Sorongo.

10 comentários:

Edmilson disse...

Me diga aonde comprar esta cachaça, pois quero mandar uma caixa pra Brasília. Tenho lá um conhecido que vive prometendo "providência" pra tudo: é pra fome 0X0, é pro pac empacado e até pro uso do dinheiro do petróleo do pré-sal (cadê o programa do bio-diesel?), que só deve começar a pingar lá pela década de 2020. Haja providência.

Unknown disse...

Edmilson, quando vc esceveu que vai mandar uma caixa pra Brasília, pensei que fosse pra mim mesmo. Mas, agora que sei quem é o destinatário, digo-lhe que não precisa mandar Providência para ele. Ele bebe em outras fontes.

Dalinha Catunda disse...

Olá Eurico,

Na realidade, os políticos, se embriagam com o poder e as providências devemos tomar NÓS, na hora de voltar.

Um abraço,
Eurico

Unknown disse...

Dri Viaro, obrigado pela visita. Já fui ao seu blog para conhecer seu trabalho e gostei do que vi. Parabéns!

Unknown disse...

Dalinha, vc é sábia, assim como todo nordestino da gema. Falou e disse!

Unknown disse...

Oi, Dri Viaro!
Olha, parabéns pelo seu blog, viu! E, menina, como vc recebe visitas e comentários, heim? Fiquei com inveja. Que Deus a conserve assim, de bem com vida, sempre.

Newdelia disse...

O ano que vem precisaremos distribuir essa pinga... haja providência, heim?
Beijocas e saudades.

Unknown disse...

Qualquer semelhança seria mera coincidência?

Ah Eurico! Vc me faz rir e muito!

Beijos, amigo

Mirse

Unknown disse...

New, acho que vou montar uma fábrica de Providência aqui em Tabuí, só para poder tomar uns providenciamentos à vontade.

Unknown disse...

Mirse,
fico feliz por saber que vc gosta do que escrevo e que a faço rir. Isto me basta: fazer alguém rir nestas épocas de tantos problemas...